sexta-feira, 20 de agosto de 2010

A NECESSIDADE DE REPENSAR O DIREITO E A EFETIVIDADE DAS LEIS AMBIENTAIS


O direito não pode mais ficar fechado em sí mesmo, com todo o seu aparato de signos, princípios e métodos. É necessário neste novo século que ele se abra para as múltiplas e complexas informações que o cerca.

Longe do embate secular entre ciência e direito, um contexto histórico claramente elucidado por SERRES*, precisamos urgentemente estabelecer uma conexão das normas com a vida.

A natureza, mesmo enquanto um sistema perfeito tem se mostrado mais frágil do que nossas percepções herdadas do passado. O individualismo do homem da contemporaneidade acabou por constituir uma sociedade moldada na responsabilidade limitada, culminando em um negligenciamento da natureza.

A relação do direito com todas as outras disciplinas do conhecimento humano, mesmo aquelas tidas mais estranhas ao estudo jurídico** pode ser o início para renovação tão necessária de uma ciência até agora muito presa ao apego de uma dogmática ultrapassada.

Uma visão mais integralista (holística) e quântica é sem duvida um exercício salutar para um reposicionamento de nosso papel no universo, o que culminará inclusive, em um resgate de uma nova concepção ética, refletindo diretamente na ciência do direito.

Segundo FAGÚNDEZ***, em citação a obra de DI BIASE, é através de uma visão mais holística que se conseguirá derrubar o muro que separa as ciências, reunificando o conhecimento humano, tornando o direito interdependente dos demais direitos. Tratar qualquer ciência como independente e autônoma é uma grande celeuma, aliás, qual a vantagem dessa autonomia? Ela de fato ajuda na concretização da resolução dos problemas? Se resolve, é de forma definitiva ou apenas aparente e temporal?

TELLES JÚNIOR**** faz uma abordagem bastante interessante e, de fato nos faz pensar melhor sobre o caráter instrumental das sociedades humanas. Ele compara as sociedades dos animais irracionais, cuja defesa da espécie é o principal objetivo com foco na coletividade ao invés da sorte individual de seus componentes, com a sociedade dos homens, composta por seres racionais, que formaram na sua sociedade um meio a serviço de cada ser que a compõe, fato inédito na natureza; o homem acabou se constituindo no fim, a causa final, a razão de ser do todo, da qual é apenas parte. Vivemos em uma sociedade instrumental, cuja submissão está essencialmente direcionada a tão somente o homem.


O problema da efetividade regulatória

A inter-relação e a interdependência de todos os fenômenos (físicos, biológicos, sociais, culturais, etc.) por si só nos obriga a repensar os conceitos e definições que outrora herdamos do chamado pensamento clássico.

Uma nova hermenêutica, mais abrangente (uma hermenêutica ecológica), se vê necessária para compreensão dos problemas complexos advindos dos novos avanços tecnológicos de nossa sociedade. Chegamos no século XXI remetidos a uma sociedade de riscos*****, e a ciência do direito nunca se viu tão despreparada para enfrentar panoramas como nos dias atuais. Há muita resistência no meio jurídico para romper certos paradigmas, uma resistência que iniciou com o comodismo de se estabelecer uma fórmula heurística para resolução dos conflitos de interesse, privando-se de uma reflexão mais aprofundada.

A Teoria do Direito precisa urgentemente passar por uma redefinição; embora o poder político tenha sido rápido em atender as novas reinvidicações da sociedade, através da edição de um número considerável de leis inerentes a proteção ambiental, estas vem se mostrando questionáveis sob o ponto de vista de sua efetividade regulatória, uma vez que a ciência do Direito, tradicionalmente fundada em uma dogmática antropocentrista restritiva e individualista, não consegue alcançar os clamores de uma sociedade altamente complexa.

Essa ineficácia não está somente presente na seara jurídica, o sistema econômico, embora com alguns avanços, também tem apresentado resistências pelo fato de que seu paradigma produtivo se encontrar centralizado na dominação e na transformação industrial em escala de massa, e o Direito, historicamente atrelado a economia acaba sofrendo reflexos desses paradigmas ultrapassados.******

Em uma era onde a sociedade está mais autônoma, surge as dificuldades de qualquer planejamento, uma vez que toda decisão jurídica, mesmo que em determinado momento possa parecer acertada, poderá acarretar em efeitos sociais desastrosos. Isso ocorre porque segundo ROCHA & CARVALHO********, uma decisão jurídica dogmática não tem condições de refletir sobre os seus pressupostos decisórios, nem sobre os efeitos colaterais por ela produzidos, porque ela está condenada a manter-se dentro de um círculo de auto-referência onde qualquer saída já estará previamente definida como erro.



* SERRES, Michel. O contrato natural. Lisboa: Instituto Piaget, 1990.

** SUITER, Heráclito Ney. O conflito entre preservação ambiental e desenvolvimento econômico.São Paulo: Clube dos Autores, 2008.

**** FAGÚNDEZ, Paulo Roney Ávila. Direito e holismo, introdução a uma visão jurídica de integridade. São Paulo: LTr, 2000.

***** TELES JÚNIOR, Goffredo. O direito quântico, ensaio sobre o fundamento da ordem jurídica. 5ª ed. São Paulo: Max Limonad, 1980.

****** BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo, hacia uma nueva modernidad. Barcelona: Paidós Ibérica, 1998.

******* Op cit, SUITER, 2008.

******** ROCHA, Leonel Severo; CARVALHO, Delton Winter de. Policontexturalidade e direito ambiental reflexivo. In: http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewFile/26929/26492. Acessado em 20.10.2009.

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